09 maio 2024

A GREVE DE 8 E 9 DE MAIO DE 1944

Se há alguma coisa que faz pouco sentido em Democracia é que, à censura oficial que se verificava sob o Estado Novo, que impedia que os pontos de vista do regime fossem contraditados, se sucedeu, depois do 25 de Abril, outro género de unilateralismo, que peca por omissão, em que agora as narrativas dos acontecimentos são feitas apenas pelo outro lado. Por exemplo, a greve de 8 e 9 de Maio de 1944, que foi fomentada e organizada pelo Partido Comunista Português torna-se numa narrativa heróica, com um generalizado apoio popular, um acontecimento sem mácula, quando é evocada por aquela organização. Do lado direito da imagem temos um panfleto da altura e a primeira página da edição seguinte do jornal clandestino Avante! E no entanto, e como já aqui se verificara aquando da evocação do 75º aniversário da prisão de Álvaro Cunhal, uma consulta aos jornais da época, mostra todo um distanciamento em relação às acções dos comunistas. Aquilo que aconteceu não foi nada como eles agora contam e os comunistas estavam muito longe de granjear o apoio popular que se subentende das suas narrativas. E repare-se como acima, do lado esquerdo, a notícia de dia 9 de Maio, que dá conta dos acontecimentos, é antecedida de um editorial intitulado A Ordem. Pelo menos para o editorialista do Diário de Lisboa (presumivelmente o seu director Joaquim Manso), fomentar greves num país neutral numa Europa em guerra não lhe parecia gesto que se saudasse.

UM TÍTULO DE JORNAL MUITO LISONJEIRO PARA O VISADO

No título que o Expresso escolheu para sintetizar a sua passagem pela Assembleia da República, o surpreendente não é a «recusa» do «ministro da Defesa» em «falar». O que me deixa verdadeiramente atónito é a presunção que «o líder do CDS» tem um «pensamento». Nem é pelo pensamento pretender ser «sobre serviço militar para jovens delinquentes». É pela miragem de imaginar que Nuno Melo pensa! E enquanto por cá o Expresso se entretém com os pensamentos secretos daquele nosso pensador, a The Economist, dedica um artigo à evolução das despesas militares dos países da NATO. Acho mais bem pensado do que generalidades vagas!

08 maio 2024

A ESPIRAL DA IMBECILIDADE

Para se perceber qual a importância que por cá têm os ministros brasileiros, um exercício engraçado seria desafiar qualquer um dos jornalistas responsáveis pelas cinco notícias abaixo a nomear - de memória... - três colegas de governo da ministra que aparece citada: pode ser, por exemplo, o da Fazenda, o das Relações Exteriores e mais um outro qualquer à escolha deles... Ficando nós assim esclarecidos quanto ao gravitas de que por cá gozam os ministros brasileiros, o nosso conhecimento sobre quem eles são, só falta mesmo a referência do que importa a opinião de uma delas... por muito que a comunicação social portuguesa se deixe assim arrastar para esta espiral da imbecilidade. Embora se tenha que reconhecer que o funileiro dessa espiral foi o Marcelo.
Apenas por curiosidade: há actualmente 31 ministros no Brasil. Num elenco assim tão vasto não será nada difícil encontrar um ministro ou outro mais predisposto a dizer disparates como o desta ministra que ninguém sabia quem era, até se destacar precisamente por isso: por dizer disparates.

O ANÚNCIO DO BOICOTE SOVIÉTICO AOS JOGOS OLÍMPICOS DE LOS ANGELES

8 de Maio de 1984. O Comité Olímpico Soviético anúncia que que o seu país não se faria representar nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, programados para arrancarem em 28 de Julho, dali por treze semanas. A notícia era acompanhada de outra, a disposição da Polónia em seguir o exemplo soviético. Até à data do início dos jogos, treze outros países da esfera de influência soviética aderiram ao boicote, num total de quinze países. Mas, ao contrário do que a notícia acima titula, dificilmente se poderia considerar a atitude dos soviéticos uma "bomba". Era apenas a retaliação - esperada - pelo boicote que, por sua vez, os Estados Unidos haviam promovido aos Jogos Olímpicos de Moscovo em 1980, que (des)mobilizara cerca de sessenta países. Por essa contagem, no final os Estados Unidos venceriam a União Soviética. Mas no que diz respeito à capacidade de cada um deles ter estragado a festa desportiva do outro, o resultado ter-se-á saldado por um empate.

07 maio 2024

A «ALMOÇARADA» NA TRAFARIA

(Republicação)
Domingo, 7 de Maio de 1944. «O 1º batalhão da Brigada Naval da Legião Portuguesa, acampado desde ontem na mata da Trafaria, terminou hoje o seu exercício de campo. Esta manhã, depois da alvorada e da missa campal, com a presença do sr. comandante Henrique Tenreiro, efectuou-se um exercício de progressão na praia entre a Cova do Vapor e a Trafaria.
Partia-se da hipótese que os legionários tinham levado a cabo um desembarque naquela zona, onde encontraram resistência. O exercício, dirigido pelo comandante do 1º batalhão, 1º tenente Horácio de Carvalho, desenvolveu-se normalmente e o batalhão, utilizando todos os serviços de transmissões, fez a sua progressão até ao local do acampamento.
Ás 13 e 30 realizou-se, á sombra do pinhal, um almoço de confraternização, a que presidiu o sr. comandante Henrique Tenreiro e com as presenças dos srs. capitão de mar e guerra Alberto dos Santos e major Nascimento, Chefe de Estado Maior da Brigada Naval, bem como de muitos oficiais, graduados, etc.
Aos brindes, usou da palavra o sr. comandante Henrique Tenreiro, que pronunciou um caloroso discurso, entrecortado de grandes aplausos.
Começou por lembrar que o sr. comandante Alberto dos Santos, grande amigo da Brigada Naval, completava hoje 70 anos, passando por isso à reforma, motivo pelo qual traçou o seu elogio.
Continuando, o sr. comandante Tenreiro afirmou que, "certos da vitória de Salazar, os legionários continuam unidos e prontos a obedecer-lhe à primeira voz".
Acentuou que a união da Brigada Naval tem sido timbre daquela corporação, sendo necessário que continue a sê-lo enquanto Salazar assim o entender.
Terminou lembrando aos legionários navais, que, sendo eles soldados da Revolução Nacional, cumpre-lhes manter cabeças ao alto, fé em Deus e na política do Estado Novo.
O sr. major Carlos Nascimento, chefe de Estado Maior da Legião, exaltou depois o espírito de unidade e a força espiritual e material dos legionários, afirmando que o comandante Henrique Tenreiro tinha na Brigada Naval um dos grande expoentes do seu espírito de grande organizador.
Por último, o sr. comandante Alberto dos Santos agradeceu as palavras que lhe tinham sido dirigidas e incitou os legionários a cumprirem sempre os seus deveres.
O batalhão regressou a Lisboa ao fim da tarde
O que acabaram de ler é a transcrição completa da notícia. Num Mundo então em guerra, esta história de umas manobras navais na outra banda quase parece uma paródia provocatória. Se do outro lado do Mundo fuzileiros navais americanos arriscavam e perdiam a vida em operações anfíbias, por cá esses exercícios eram encenados com a seriedade de um piquenique ao fim de semana: houvera uma noitada de acampamento, seguida de alvorada e missa (não houve café da manhã?...), com o prato de resistência a ser constituído por uma passeata de uma meia hora entre duas praias (cova do vapor e trafaria) para apanhar a brisa do mar e assim se ir abrindo o apetite para o almoço, servido à sombra dos pinheiros, a seguir ao qual houve uma sequência de discursos para ajudar a digestão. Houvesse ele invasão e a Pátria estava salva graças ao 1º batalhão da Brigada Naval da Legião Portuguesa!

A RENDIÇÃO DE DIEN BIEN PHU

(Republicação)
7 de Maio de 1954. Há 70 anos rendiam-se as últimas unidades francesas que ainda resistiam em Dien Bien Phu ao cerco que lhes fora imposto nos últimos 57 dias pelas forças do Viet Minh. O local da batalha, no mais remoto interior do Norte do Vietname, no coração de uma região absolutamente controlada pelo Viet Minh (ver mapa mais abaixo), fora escolhido pelos próprios franceses, o que tornava a derrota ainda mais amarga. Em Paris, o Le Monde embrulhava-a numa circunspecta constatação factual: não há notícias da guarnição de Dien-Bien-Phu.
Não se consegue justificar uma derrota desta amplitude sem ter que condenar aqueles que foram os seus responsáveis militares e, quando não se quer fazer isso, romantiza-se o episódio, divergindo a atenção da narrativa da batalha para os actos de bravura individuais dos combatentes e/ou para aspectos anedóticos a ela associados. Em Dien Bien Phu, as posições francesas (acima) tinham todas nomes femininos, a que alguém mais imaginativo pôs a correr tratar-se das antigas amantes do general francês que comandava a guarnição. É uma história engraçada para justificar o feminino num meio onde ele era escasso, mas, mais prosaicamente, tratou-se apenas de dar sonoridade a posições que haviam sido designadas inicialmente pelas letras do alfabeto: A (Anne-Marie), B (Béatrice), C (Claudine), D (Dominique), E (Eliane), F (?), G (Gabrielle), H (Huguette) e I (Isabelle).
Se o mapa do campo de batalha de Dien Bien Phu (mais acima) é costumeiro, muito mais raro é este mapa acima, que nos mostra a situação militar na Indochina Francesa nesse mesmo mês de Maio de 1954 e que, à época, deveria ser um segredo militar.. As regiões pintadas de laranja são consideradas sobre controle do Viet Minh e as encarnadas são as que estão em disputa. Embora as populações se concentrem mais nos deltas dos rios e nas zonas costeiras e ribeirinhas, mesmo assim é evidente que coexistiam duas administrações rivais na Indochina: a que transitara da administração colonial francesa e a nacionalista/comunista. Dien Bien Phu foi só a constatação sangrenta da impotência francesa.

A ESTREIA DA 9ª SINFONIA DE BEETHOVEN

7 de Maio de 1824. Em Viena, no teatro de Kärntnertor (actualmente inexistente), tem lugar a estreia da 9ª Sinfonia de Beethoven. Apesar de estreada em Viena, onde o soberano era o imperador austríaco, a obra foi dedicada ao rei Frederico Guilherme III da Prússia (Beethoven nascera em Bona, na Alemanha ocidental). A extensa composição (dura aproximadamente uma hora e dez minutos a ser executada) foi a última obra completa do compositor, é a mais conhecida da sua autoria e é também uma das mais conhecidas do que se costuma designar por música clássica. Há várias histórias associadas a esta estreia, das quais prefiro reter para esta evocação a que refere que foi preciso que Beethoven - que já então estava completamente surdo e que, pretensamente, estava virado para a orquestra, dirigindo-a - fosse rodado por uma das intérpretes - a jovem Caroline Unger - para que, só então e de frente para o público, visse quanto o público aplaudia entusiasticamente a sua obra! Para benefício do leitor, reduzi a reprodução acima à passagem mais conhecida da obra - apenas três minutos! - a Ode à Alegria.

06 maio 2024

PORTUGAL 6, BRASIL 0, E O RICARDO COSTA É UMA LÁSTIMA A ARBITRAR

Este é um daqueles momentos que é uma verdadeira angústia do ponto de vista científico e académico, tal é o desequilíbrio de cultura e conhecimentos entre o historiador português João Pedro Marques e a jornalista brasileira Giuliana Miranda. Uma pessoa normal apercebe-se que a cena é um massacre intelectual: naquilo que concerne especificamente ao tópico da escravatura transatlântica, o primeiro estudou-o aprofundadamente, encadeia mesmo vários argumentos* arrasadores contra as pretensões brasileiras de se desresponsabilizar por aquele comércio, enquanto a segunda acha umas coisas e limita-se a ripostar com umas interjeições que se pretendem pretensamente irónicas. Um conhece o assunto de que está a falar, a outra não faz nem ideia. Também, é uma mera jornalista... Escrevi mais acima que uma pessoa normal aperceber-se-ia do significado da cena, só que os anfitriões deste patético momento foram a SIC Notícias e Ricardo Costa, que não é uma pessoa normal: é um jornalista de televisão também particularmente ignorante como a Giuliana. Se o fosse (normal), Ricardo Costa teria compreendido o que estava a acontecer e interrompido o espectáculo, como o fazem os árbitros de boxe, para protecção do mais fraco quando se vê que há um desequilíbrio notório entre os contendores. Aqui não: o programa prosseguiu fingindo que os argumentos se equivaliam. Pobre Giuliana! Tonto Costa! (Recordo aqui que Ricardo Costa era alguém que, há quinze anos, julgava que as doze estrelas da bandeira europeia representavam cada uma os estados membros - ignorância por ignorância, recordemos que isto não é só a ignorância do número das quinas do Sebastião Bugalho, a classe dos opinadores está muito bem servida de tontos ignorantes...)

QUEM É QUE MORREU, MESMO?

Uma reflexão que podemos transpor para a actualidade e para os obituários que actualmente se vão publicando, a respeito da verdadeira importância daqueles que morrem. Em 6 de Maio de 1949 o Diário de Lisboa concede o destaque que a imagem acima documenta à morte de Maeterlinck. Um dramaturgo belga que escrevera as suas obras mais importantes ainda no século XIX e que recebera o prémio Nobel da Literatura em 1911, É um exemplo acabado daquelas personalidades que em 1949 já haviam desaparecido de circulação há muito, e que 75 anos depois de morrerem só existem mesmo na wikipedia. (sinal de que o jornalismo não tem piorado com os tempos: a idade do falecido está enganada: tinha 86 e não 88 anos...)

Exemplo concreto de um outro Maeterlinck deste próprio dia 6 de Maio de 2024: Bernard Pivot, crítico literário e anfitrião durante décadas de programas de difusão literária na televisão francesa. Será por causa disso que todos os afrancesados sofisticados cá do burgo se sentem na obrigação de assinalar nas suas páginas pessoais o seu falecimento. Em contraste, e porque quem costuma alimentar as páginas da wikipedia em português são brasileiros, não existe (ainda) página dedicada a Pivot no nosso idioma.  

A INAUGURAÇÃO DO TÚNEL SOB O CANAL DA MANCHA

6 de Maio de 1994. Com a presença dos dois chefes de Estado, tem lugar a inauguração do túnel sob o canal da Mancha. Um momento histórico concretizando uma ideia tão antiga que até ocorrera ao próprio Obélix!

05 maio 2024

O PLANO... QUAL PLANO?... (ESCLARECIDO)

Só agora é que se percebe com clareza em que consiste o Plano de Emergência para a Saúde prometido por Luís Montenegro há mais de 100 dias (22 de Janeiro de 2024). Notabilizava-se por não existir e por ninguém - a começar pelo próprio Montenegro que o anunciou - fazer a mínima ideia quais seriam as suas linhas gerais quando foi prometido. Só agora é que um grupo de 13 sábios o irá «desenhar» (4 de Maio de 2024). Depois de terem entretanto deixado passar mais de três meses, os sábios têm agora um (mês) para «apresentar(em) propostas». Esperemos que os sábios tenham jeito para o desenho, porque é patente que os políticos - o primeiro-ministro e a ministra da Saúde - não têm jeito nenhum, nem para a política.

A ASSINATURA DO TRATADO DE FUNDAÇÃO DO CONSELHO DA EUROPA

Londres, 5 de Maio de 1949. Representantes de dez países europeus - Bélgica, Dinamarca, França, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, Reino Unido e Suécia - assinam naquela cidade um tratado que é também o acto fundador da organização conhecida por Conselho da Europa. Como se pode ler no subtítulo da notícia do New York Times, no acto a Grécia e a Turquia foram convidados a aderir à organização. Aparecem assim associados ao acontecimento quase todos os países europeus situados fora da esfera de influência soviética. As excepções são os dois países ibéricos, um gesto de marginalização que tem um evidente significado político, tanto mais que se segue à assinatura do Tratado da Nato, realizada no mês anterior. Depois da adesão à NATO, esta proscrição é uma desfeita para o país, para o regime e para a diplomacia portuguesa. Por isso não é de estranhar o silêncio da nossa imprensa a não noticiar aquilo que acontecera em Londres. Como se comprova, a omissão não se devera à dificuldade em seleccionar os assuntos em destaque: a primeira página do Diário de Lisboa dedicava quase uma coluna inteira ao óbito aos 88 anos do dramaturgo belga Maeterlinck - quem?!...

04 maio 2024

UMA DISCRETA GUERRA COLONIAL E CIVIL EM CURSO

4 de Maio de 1964. No New York Times (acima, à esquerda, clique em cima da imagem para a ampliar e poder ler) e no Diário de Lisboa do dia seguinte (embora esta de forma mais sucinta) dá-se conta do agravamento da situação militar na colónia britânica de Aden, no Iémen do Sul. Já aqui neste blogue se falou desta guerra esquecida. E também já aqui se mencionou a capacidade britânica de disfarçar pela semântica e por uma atitude política distanciada - a famosa fleuma britânica - da gravidade das situações em que aquele país se envolve. No caso da nomenclatura, volto a lembrar aquela constante de que as guerras coloniais de libertação que envolveram as colónias britânicas nunca se chamaram... guerras coloniais: esta era uma insurgência (abaixo), na Palestina fora outra insurgência, na Malásia uma emergência, em Chipre outra emergência, no Quénia uma revolta (uprising). Em suma, os britânicos nunca travaram nenhuma guerra colonial e por isso, ao contrário de franceses, portugueses ou holandeses, eles nunca perderam nenhuma guerra colonial. Esse discurso político não é lá muito compatível com os relatos da actividade militar porque, não tendo havido guerras, torna-se difícil explicar porque é que terá havido campanhas e operações militares, como se pode ler abaixo... Quanto à famosa fleuma britânica, ela está patente no desprendimento constante da notícia do Diário de Lisboa, a disponibilidade veiculada pelo jornal londrino Times para que os britânicos abandonassem Aden e o Iémen do Sul. Era ainda mais uma maneira de desviar atenções daquilo que estava verdadeiramente em disputa. É que as guerras coloniais não se travam apenas para manter a autoridade política nas colónias, as potências coloniais também as travam para gerirem o processo de transferência de poderes e o futuro regime do novo país independente. Era o que os britânicos pretendiam para o Iémen do Sul, e que hoje se sabe, então guardado para dali a três anos e meio de distância no futuro, que os britânicos falharam redondamente. (Já aqui me referi mais longamente no Herdeiro de Aécio a esta guerra colonial com outro nome)

03 maio 2024

O PLANO... QUAL PLANO?...

Assim como havia o papel do sketch dos Gato Fedorento (...qual papel?), também neste caso no PSD podem fazer um jogo de palavras quanto ao plano. Qual plano? Ele há o de emergência para a Saúde prometido em 60 dias por Luís Montenegro (acima, à esquerda), há o de motivação dos profissionais da Saúde, prometido no programa eleitoral (abaixo), e parece haver ainda um terceiro plano, para o Verão, aquele que a nova ministra da Saúde pediu, à cara podre, ao ainda director-executivo do SNS, depois de ter aceite a sua demissão. A verdade é que, mesmo quando não ganham títulos e saem despedidos, ninguém manipula os Josés Mourinhos, seja o original, seja este da Saúde... Por outro lado, pela forma como o assunto se apresenta, o terceiro plano, aquele que a ministra tentou cravar, deve ser o único plano que interessa ao bem estar dos portugueses, e é precisamente aquele para o qual o governo não fará a mínima ideia sobre o que fazer, e para o qual vai ter que improvisar qualquer coisa... O que vale é que me parece que existe um SNS que funciona independentemente desta malta que - teoricamente - o encabeça. Funciona sem eles e às vezes apesar deles.

O REGRESSO DOS EXILADOS DE ARGEL, INCLUINDO MANUEL ALEGRE (O DE BARBAS)

3 de Maio de 1974. O dia anterior, «por volta das 18 horas», fora o do regresso dos exilados de Argel, a sede da «Rádio Voz da Liberdade». Embora aqueles que a ouviam conhecessem a sua voz (não seriam tantos quanto isso...), a figura de Manuel Alegre era perfeitamente desconhecida dos portugueses e a legenda da fotografia da ocasião tem o cuidado de precisar que Manuel Alegre era o que aparecia «de barbas», para o distinguir do apagado bigode de Piteira Santos. Guardado para o futuro de Manuel Alegre estava uma promissora carreira no domínio do humor político, a sua voz declamatória e as suas barbas tornaram-se na imagem de marca do seu boneco, Manuel Triste, que a esse, ninguém o calava!...

OS «CRIMES» DO «INSPECTOR» VARATOJO

(Republicação a pretexto do cinquentenário da primeira publicação do anúncio do inspector Varatojo, desmentindo que a inspecção dele tivesse alguma coisa a ver com a PIDE)
Figura mediática (sobretudo televisiva) de antes do 25 de Abril, a imagem de Artur Varatojo (1926-2006) estava indissociavelmente ligada à criminologia e à literatura policial. Foi por isso com alguma surpresa que, nas semanas que se seguiram ao 25 de Abril, os leitores dos jornais o viram a ele (entre muitos outros), a desmentir em anúncios pagos (abaixo) que alguma vez tivesse pertencido ou estado ligado à PIDE. Houve quem atribuísse essas preocupações ao epíteto forjado de inspector que adoptara por causa da sua imagem.
Porém, uma possível explicação alternativa, mais séria e mais elaborada, para o que parecia a defesa contra uma sanha persecutória contra o Varatojo podemos encontrá-la na capa de uma revista que foi publicada dois meses e meio depois do 25 de Abril e onde se empilham casualmente fichas de funcionários da PIDE e ali encontramos uma de um homónimo (assinalada a branco) do nosso amável investigador policial. Eram tempos de Liberdade, mas onde era impróprio usurpar títulos de inspector e possuir-se um apelido inconveniente
Este é um texto que, conjuntamente com o do Caçador de Pides mais abaixo e glosando mais uma vez José Carlos Ary dos Santos, poderá constituir uma série a que, pela imaginação e por isso orientadas para o céu, se pode dar o título de, em vez de portas, as mansardas que Abril abriu

02 maio 2024

OS EXERCÍCIOS MILITARES OVIBEJA 2024

Acho interessantíssimo que o actual ministro da Defesa pareça estar tão folgado de problemas associados à sua própria pasta, que ainda lhe sobre tempo para ter atribuído esta prioridade de ir hoje à Ovibeja 2024, pronunciar-se sobre problemas de agricultura. Onde se lamentou de ter sido mal interpretado (acima). Se calhar andamos todos a interpretá-lo demasiado mal: não apenas naquilo que diz, mas também no modo como ocupa o tempo...

A AUDIÇÃO QUE É APRESENTADA COMO SE FOSSE O CARTAZ DE UM FILME CATÁSTROFE DO ANOS 70

Como se pode ler acima, por proposta do PCP foi aprovada pelo parlamento a audição por aquele órgão do processo de privatização da ANA, que se realizou em 2012, vai para 12 anos. E o formato como a notícia é dada acima é outro regresso ao passado, evocativo dos cartazes daqueles filmes catástrofes da década de 70. Naqueles filmes - como acontecerá nestas audições parlamentares - a maioria dos espectadores conheciam de antemão os contornos gerais do enredo e estavam seguros quanto ao desfecho - que obviamente não vai ser nenhum, neste caso da privatização da ANA. Mas, mesmo sabendo tudo isso de antemão, o que os estúdios de cinema consideravam que era importante para captar as atenções dos espectadores era o elenco robusto de estrelas de cinema que entrava no filme. A única coisa que falta à notícia da Lusa de hoje, quando em comparação com os cartazes de há 50 anos são só as fotografias alinhadas das estrelas desta audição... De resto, tem tudo a ver com aeroportos.

IGNORÂNCIAS...

As ignorâncias acontecem com todos nós. Eu ainda me lembro de quando, e «apesar da preocupação do Bloco de Esquerda» com a moralidade política, era esta mesma Mariana Mortágua que não compreendia o conceito e as consequências do que era ser-se deputado em exclusividade. E, aqui entre nós, parecia-me ignorância mais importante do que esta de saber quantos são o número de quinas do escudo nacional.

ARGUMENTAÇÃO EM ESTILO «PEGA DE CERNELHA»

Repare-se acima como, se embarcarmos na estrutura como João Miguel Tavares argumenta o episódio das declarações do ministro da Defesa, deixa de ser primordial aquilo que o ministro disse, para a importância se transferir para as reacções ao que ele, Nuno Melo, teria dito. O teor das suas declarações deixa de ser o núcleo do problema, já que terá sido apenas «algo vagamente surpreendente». Não. O que Nuno Melo disse foi particularmente estúpido e é isso que explicará a amplitude do ribombar das reacções. O exercício a que João Miguel Tavares acima se dedica é o de (tentar) inverter o nexo entre a causa e o efeito, será como tentar pegar um touro mas sem lhe tocar nos cornos (os cornos são os disparates proferidos por Nuno Melo). Em tauromaquia (e é o próprio João Miguel Tavares que evoca a metáfora tauromáquica no seu artigo, quando compara Nuno Melo a «um forcado do Aposento da Moita»), chama-se a esse expediente uma «pega de cernelha» (veja-se imagem acima). Emprega-se quando não se quer ou não se pode pegar o touro de caras. Quanto a forcados, ainda que metafóricos, João Miguel Tavares também não se sai muito bem como cabo honorário dos Amadores de Portalegre.