24 fevereiro 2018

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24 de Fevereiro de 1988. Por uma sentença unânime dos oito juízes do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, a revista satírico-pornográfica Hustler foi absolvida de ter que pagar uma indemnização de US $150.000 a que fora condenada, por causa de um pedido de compensação que contra ela fora apresentada pelo televangelista Jerry Falwell (1933-2007). Na edição de Novembro de 1983, a revista publicara um falso anúncio, parodiando uma campanha então em curso de uma marca de aperitivos italiana - acima, à esquerda e a cores, um anúncio original, e à direita a versão paródia da Hustler. A campanha, que fora bem sucedida na notoriedade alcançada, envolvia um conjunto de celebridades (o exemplo acima é com a actriz Jill St. John) a falarem da sua "primeira vez", num jogo de palavras de sugestão sexual, mas que se referia prosaicamente à primeira vez que haviam provado o aperitivo. O que tornava Jerry Falwell num alvo apetecível para a paródia era a sua imagem pública como televangelista fundamentalista e reacionário. Mas acrescente-se que o estilo de humor usado pela revista é bastante grosseiro: a hipotética "primeira vez" de Falwell era um caso de incesto... Jerry Falwell processou a revista e o seu dono Larry Flynt (n. 1942). Para nenhuma das partes era uma estreia: a Hustler já fora anteriormente processada e perdera alguns casos, assim como Jerry Falwell também já procurara processar a revista Penthouse (concorrente da Hustler) e também perdera. Num primeiro julgamento Jerry Falwell ganhou e o júri acordou-lhe os já acima referidos US $150.000 de indemnização. Mas Larry Flynt recorreu.

Oito anos depois da sentença do Supremo Tribunal por onde começámos esta história, foi produzido o filme «The People vs. Larry Flynt». Realizado pelo checo Miloš Forman, o filme é uma biografia de Flynt que tem por clímax a sentença de que hoje se completa o 30º aniversário. Protagonizado por Woody Harrelson como Larry Flynt, nesta cena do filme o seu advogado (Edward Norton - na mesma cena, acrescente-se a curiosidade de que o juiz é o próprio Larry Flynt) profere um veemente e eloquente discurso alertando os membros do júri para que façam a distinção entre a concordância com o conteúdo do que é proferido e a preservação da liberdade de expressão. Embora esta seja provavelmente a cena mais marcante do filme, a verdade é que o resultado real (Flynt foi condenado) demonstrou que o processo de julgamento por tribunal de júri talvez não seja o mais recomendado para tais abstracções. A celebrada vitória de Flynt, a preservação da Liberdade de Expressão, só veio a ser conseguida diante de uma Assembleia de Profissionais. E, só para rematar, diga-se que eu tenho sérias dúvidas que o actual presidente daquele país consiga perceber a ideia que Edward Norton tenta explicar no vídeo acima e que acaba vertida na sentença do Supremo Tribunal...

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