27 setembro 2017

GARMENDIA E OTAEGUY E O NOSSO «ASSALTO ÀS TULHERIAS» (ESPANHOLAS)

27 de Setembro de 1975. Em Espanha, o regime procedia à execução de cinco militantes de grupos terroristas anti-franquistas, dois da ETA-pm e três da FRAP. Não se sabia na altura mas estas seriam as últimas execuções do franquismo. Mas, para nós, não é a história do que aconteceu (e virá a acontecer) em Espanha que nos interessa hoje, nesta efeméride. Cá por Portugal, um Portugal por esta altura delirantemente revolucionário, desde há um punhado de semanas que aparecera uma gigantesca campanha de opinião dedicada a problemas espanhóis, nomeadamente empenhada em salvar os dois etarras condenados à morte. De um dia para o outro os nomes de Garmendia e Otaeguy e a causa da sua libertação tornaram-se um must incontornável das nossas pinturas de parede (acima), dos mais variados plenários de trabalhadores (abaixo) e até mesmo de programas de televisão! Não é por isso de estranhar que a notícia das cinco execuções desse dia 27 de Setembro de 1975 tivesse sido recebida com ultraje em Portugal. Com a população previamente aquecida pela comunicação social, a reacção popular foi tão lamentável quanto previsível: à noite, os manifestantes que se haviam concentrado para protestar pelas execuções, assaltaram e pilharam tanto a embaixada quanto o consulado de Espanha em Lisboa perante a passividade dos destacamentos militares posicionados para os defender. Posteriormente, os assaltantes fizeram fogueiras com o recheio. Todo este processo pode ser equiparado, em termos revolucionários, com o famoso assalto e pilhagem do palácio das Tulherias durante a Revolução Francesa (10 de Agosto de 1792), só que aqui, a plebe portuguesa, em jeito de espertalhona, dedicou-se a pilhar os bens do país vizinho.
O que é perene, para além de todo o embaraço diplomático e internacional em que o episódio se tornou, é o estilo descontraído como a gravidade dos factos é escamoteada na imprensa progressista publicada no dia seguinte. Não nos esqueçamos que, de acordo com o direito internacional, uma embaixada é tradicionalmente considerada território soberano do país e, como tal, inviolável pelo país anfitrião. «Milhares de manifestantes invadiram, ontem à noite, os edifícios do Consulado e da Embaixada de Espanha em Lisboa, destruindo depois, pelo fogo, todo o recheio, protestando assim, contra a decisão de Franco de mandar matar cinco patriotas espanhóis. Manifestando justamente a sua ira e o seu repúdio por mais esta prepotência do chefe fascista espanhol e do regime que ele personifica, os milhares de pessoas começaram por se dirigir ao edifício da Rua do Salitre onde se localizam os serviços de Chancelaria e Consulado espanhóis, destruindo tudo o que não podia ser lançado pelas janelas no próprio local e consumindo o resto numa fogueira que imediatamente se ateou na via pública. Depois, os manifestantes, entre os quais inúmeros espanhóis, dirigiram-se à Praça de Espanha, não sem ter destruído ainda na Rua do Salitre um Mercedes pertencente aos serviços oficiais espanhóis. Aos gritos de "FRAP", "Franco assassino", "Franco para o garrote" e "Morte ao fascismo", a multidão percorreu a Avenida da Liberdade e a Avenida António Augusto Aguiar, dirigindo-se ao edifício da Embaixada espanhola. Primeiro, saltaram os vidros das janelas, quebrados por projécteis atirados pelos manifestantes. Depois, foi o assalto e o incêndio do recheio. Dois automóveis foram destruídos pelo fogo. Entretanto, cerca das três horas da madrugada, era detectado um incêndio no rés-do-chão e na cave do consulado espanhol. Nos edifícios da Embaixada e do Consulado foram hasteadas bandeiras da FRAP.» Posteriormente, a Espanha apresentou a conta dos estragos que Portugal pagou sem tugir...

2 comentários:

  1. É como diz e foi assim mesmo: "Posteriormente, a Espanha apresentou a conta dos estragos que Portugal pagou sem tugir..." Vivia então nas redondezas, passei por lá no dia seguinte e recordo-me de que até uma banheira - daquelas antigas de metal e com pernas - havia sido atirada para o meio da rua...

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  2. Curiosamente, a capela - com saída directa para a rua - foi das poucas áreas do palácio que escapou completamente incólume à devastação, o que parece demonstrar que a fúria que a causou não terá sido assim tão espontânea quanto isso...

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