24 setembro 2015

É PRECISO QUE TUDO MUDE...

Ao princípio conhecemo-lo formulado pelo italiano Lampedusa mas é entre os alemães que eu o vejo recorrentemente a ser praticado em caso de bronca das grossas – a ponto de, quando leio a notícia de que o chairman da Volkswagen se demitiu, me ficar a suspeita que o terá feito para cortar cerce as acusações e especulações que se seguem quanto à reputação do grupo e não por qualquer questão de princípio. Recordo. Em Novembro de 2000 foi registado o primeiro caso de BSE nos Açores. O que era inaudito! Pela sua posição geográfica, o arquipélago estava naturalmente isolado da contaminação. Esta tivera que ter tido lugar na origem – e a vaca era alemã. Começou-se a puxar a meada da história de uma vaca infectada com BSE num país onde a doença nunca se registara e descobre-se que afinal houvera um esforço deliberado das autoridades alemãs para omitir os seus casos de BSE, cujo reconhecimento teria levado Bruxelas a colocar as suas manadas em quarentena, bloqueando o comércio externo, como acontecera com outros países da UE (Reino Unido, Espanha e também Portugal - só no continente). Escândalo! Pouco mais de um mês depois, em princípios de Janeiro de 2001, houve que fazer saltar dois ministros federais, o da agricultura e a da saúde, para que Giuseppe de Lampedusa tivesse mais uma vez razão. Porque nada mais aconteceu. É assim que os problemas se resolvem na Alemanha, quiçá consequência dos traumas dos Julgamentos de Nuremberga. Responsabilidades: todas e assumidas o mais cedo possível. Sancionamentos: o mínimo ou nenhum; sabem que, dos cerca de 6.500 guardas das SS de Auschwitz que sobreviveram à Guerra, só 790 (12%) foram presentes a tribunal? E que desses, 750 (95%) saíram condenados? Os alemães mantêm uma relação com a culpa muito bizarra... A fotografia é de Andreas Heumann, tirada no Norte da Alemanha. Estranhas paragens aquelas em que até as aves marinhas parecem dispor de um instinto natural para a ordem unida, alinhando-se pela direita...

Adenda: Este texto continha originalmente dois erros, e dos grosseiros, sobre a citação e a pessoa de Lampedusa, que agora rectifiquei. O que torna a escrita nestes suportes diferente daquilo que se fazia no passado é que, em querendo-o e estimulando-o, a qualidade do que aparece publicado pode resultar não apenas da inspiração e do trabalho de quem escreve mas também do grau de exigência e de intervenção de quem lê.

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