11 fevereiro 2015

O MOMENTO DA VERDADE – AS TAIS DE REFORMAS E O CRESCIMENTO ECONÓMICO DA EUROPA

Foi muito interessante registar algumas reacções ao artigo que Vítor Bento escreveu recentemente (Eurocrise: uma outra perspectiva) sobre aquilo que foi por si baptizado de eurocrise, o impasse em que caíram as políticas prosseguidas dentro da zona Euro. Como um especialista em relações internacionais antecipando de perto o falhanço da busca de armas de destruição maciça no Iraque em 2004, Vítor Bento terá tornado muito mais peremptórias as críticas já por si manifestadas à política europeia que vêm sendo prosseguida sob a égide alemã. E o impacto do que escreveu parece ter sido multiplicado por: a) o artigo ter sido publicado no Observador, um jornal onde se concentra um batalhão de cronistas defensores da causa desta solução liberal para os problemas europeus; b) os membros desse batalhão considerarem que Vítor Bento é considerado confusamente como um deles – um defensor da dita causa. Será por isso que o artigo de Rui Ramos em resposta ao seu artigo (O Euro, a Grécia, as dúvidas de Vítor Bento e as minhas) naquele mesmo Observador começará cheio de salamaleques num trocadilho entre as dúvidas do economista em relação ao euro e as dúvidas do historiador em relação às dúvidas do economista. Depois, os comentários de Rui Ramos evitam rebater especificamente algo que Vítor Bento tenha concretamente escrito. O artigo deste último tem gráficos e quadros e aí, nesses campos das ciências mais exactas, desconfio que Rui Ramos (perpetuando aliás uma tradição enraizada na classe dos historiadores) não se sentirá confortável, não sabendo, por exemplo, nem como, nem para quê, se deriva/integra uma função. A refutação faz-se assim na base de muita conversa/escrita e alguns números, pela concessão de que nem tudo terá corrido pelo melhor (talvez o programa pudesse ter sido melhor), mas as responsabilidades do fracasso, essas são inequívocas (a falta de competitividade da economia gregaa sua recusa de melhorar a sua competitividadeas reformas ficaram mais ou menos no papel dos memorandoso crescimento económico necessário para absorver o desemprego não apareceu).
Confesso que, por muito respeito que dedique aos textos de Rui Ramos, já me chateia a merda da conversa das reformas. É um argumento recorrente, mas fluído: cada cabeça, cada sentença quanto às que são para considerar indispensáveis. Isso faz com que tanto se possa argumentar que foram um sucesso (acima) como que as de fundo não foram feitas ou, ainda, tendo-o sido, nunca o foram à dimensão que possibilitasse o tal de crescimento económico que, recorde-se, era a promessa e a justificação para que houvesse uma fase transitória de austeridade severa – por exemplo: será que alguém se lembra que em 2011 as previsões de crescimento da economia portuguesa para o ano findo (2014) eram de 2,5%? É que, sem o tal de crescimento económico, todo o exercício argumentativo imposto à Europa – e aos países meridionais em especial – nestes últimos anos colapsou, assim como – para regressar à analogia empregue acima – a ausência de armas de destruição maciça no Iraque mostrou a falsidade daquilo que os norte-americanos haviam invocado para o invadir. Mas deixem-me terminar rebatendo a fábula das reformas com um contraditório delicioso de tão absurdo: abaixo podem ver num gráfico um histórico das taxas de crescimento do PIB da economia indiana. Ano em que esse crescimento seja inferior a 5% pode ser considerado um ano de crise. Pois bem, a Índia possui uma das legislações mais rígidas quanto ao despedimento dos funcionários públicos. São mais de 6 milhões e considerados os mais ineficientes da Ásia! De quando em vez aparecem umas notícias na secção de curiosidades dos jornais onde um funcionário é despedido por faltar ao trabalho há 24 anos... As reformas ainda estão por fazer e não se liberalizaram os despedimentos na função pública na Índia. Tão pouco se liberalizaram as condições para a instalação das multinacionais, protegendo-se, em vez disso e ostensivamente, as corporações locais. Querer-me-ão fazer crer que as taxas de crescimento da economia indiana seriam duplas/triplas (15%/25%) destas abaixo só por causa do impacto de tais reformas ainda por fazer? Acreditem os cronistas do Observador... e olhem que é preciso muita fé.

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