OS PAÍSES E OS POVOS

«No estrangeiro, a situação era geralmente melhor do que na Rússia, mas na Rússia os homens eram melhores do que no estrangeiro.»

Quando Luís Montenegro conseguiu dissociar recentemente o estado do país e o do povo, dizendo que a vida das pessoas não estava melhor mas que o país o estava e muito, ele limitou-se a continuar uma habilidade estilística que já tem, pelo menos, mais de 200 anos. O autor das palavras iniciais chamava-se Mikhail Speransky (1772-1839), professor de matemática e física e um extraordinariamente competente funcionário da administração do czar que foi durante quatro anos (1808-1812) o favorito de Alexandre I e o catalisador da tentativa de reformar a Rússia em moldes ocidentais. Falhou. Não por causa das virtudes intrínsecas das reformas que Speransky quis implementar, mas por causa da conotação estrangeira – o modelo era o napoleónico – que os prejudicados por elas lhes conseguiram fixar. No fim, quando Alexandre se defrontou com Napoleão em 1812, teve que deixar cair Speransky. E aquilo que fracassou na Rússia dos princípios do Século XIX parece repetir-se no Portugal dos princípios do Século XXI: com Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque a parecerem ir receber instruções a Berlim e com Vítor Gaspar a parecer ser recompensado pelos lá de fora, tudo aquilo que eles dizem pretender reformar parece induzido e conotado com o exterior. O país – o tal que, segundo Montenegro, está muito melhor – parece mudar mas a História tende a provar que – sem as pessoas – não.