03 agosto 2013

O EMBAIXADOR

Patrick J. Hurley (1883-1963), que na fotografia acima vemos entre Mao Zedong (1893-1976) e Chiang Kai-shek (1887-1975), numa pose que pretende passar por mediação, foi o embaixador norte-americano na China na fase final da Segunda Guerra Mundial, entre Novembro de 1944 e Novembro de 1945. A carreira prévia de Hurley fora uma daquelas misturas entre o político e o militar que seria impensável nas democracias europeias. Fora Secretário da Guerra na administração republicana de Herbert Hoover (1929-1933) e, depois dos Estados Unidos terem entrado na Guerra com Pearl Harbor em 1941, Patrick Hurley havia sido remobilizado como representante pessoal do presidente (democrata) Franklin D. Roosevelt numa daquelas iniciativas destinadas a demonstrar coesão nacional suprapartidária. Em Agosto de 1944, Hurley foi enviado para a China, num momento em que as relações, tanto militares quanto diplomáticas, entre chineses e norte-americanos haviam atingido um nadir e as colocações ali eram considerados um verdadeiro cemitério de reputações. Dois meses após a chegada de Hurley, o chefe da importante missão militar na China, Joseph Stilwell (1883-1946) foi demitido e, no mês imediatamente a seguir, foi o embaixador (de carreira) Clarence Gauss (1887-1960) a demitir-se. Foi aí que Patrick Hurley aceitou, diz-se que a contragosto e apenas por insistência presidencial, suceder a este último.

O desempenho de tal cargo terá sido, no mínimo, controverso. Patrick Hurley cilindrava o cuidadoso protocolo chinês insistindo em tratar Chiang Kai-shek por Mister Shek, esquecendo não só o título de Generalíssimo que o próprio tanto prezava quanto o facto, de ignorância imperdoável para quem trate com chineses, de que o apelido de um chinês precede sempre o seu nome, e que assim deveria ser por Chiang que o embaixador pretenderia tratar o seu interlocutor. Porém, na questão dos tratamentos, Chiang seria o privilegiado, pois o seu rival Mao Zedong nem direito ao tratamento por Mister tinha. Não seria um gesto imparcial para quem tinha por missão conciliar as duas facções, mas o mais peculiar no tratamento era mesmo a forma como ele pronunciava o nome do líder comunista chinês, soando a algo parecido com Moose Dung¹, para divertimento de quem estava presente nas reuniões e percebia inglês (a maioria). É verdade que a direcção comunista chinesa, não acreditando na sua pretensa imparcialidade, se desforrava tratando Hurley por o palhaço, inspirada nos seus exuberantes papillons, mas os piores epítetos que lhe eram dedicados partiam dos seus próprios (in)subordinados, que o consideravam não apenas ignorante, mas também estúpido e pretensioso, uma versão norte-americana do Coronel Blimp. Mais enigmático, o OSS (antecessor da CIA), tratava-o por Albatroz...
Parecendo representar o exemplo consumado do mau embaixador, obtuso às sensibilidades e peculiaridades do país onde estava creditado, Patrick J. Hurley veio a demitir-se um ano depois de nomeado, já Harry Truman ocupava a presidência. Embora os aspectos acima descritos sejam apenas uma parte, talvez a mais anedoticamente castiça, do seu desempenho na função é significativo da benignidade e assim, da distorção, que as biografias da Wikipedia podem assumir quando se constata, apesar de se tratar de características conhecidas (veja-se a legenda da fotografia acima), que nenhuma delas aparece mencionada na entrada da Wikipedia referente ao seu nome.

¹ Bosta de alce.

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