06 agosto 2008

SOBRE A ETIQUETA PRESIDENCIAL

Sempre julguei que havia uma espécie de gentlemen´s agreement* entre ex-Presidentes da República e aquele que está em exercício segundo o qual os primeiros se absteriam de comentar de forma transparentemente crítica e publicamente as acções do incumbente. Afinal, pareço estar enganado: ou tal acordo tácito nunca existiu ou Mário Soares esqueceu-se da boa educação e teve mais um daqueles seus famosos momentos menos gentleman. No passado, lembremo-nos de qual foi a sua reacção após a derrota na corrida para o lugar de presidente do Parlamento Europeu no Verão de 1999, quando qualificou de discurso de dona de casa o pronunciado pela sua rival vencedora, Nicole Fontaine. Ou, ainda mais recentemente, o seu comportamento durante a cerimónia de posse de Cavaco Silva, quando a abandonou logo após os discursos, sem sequer cumprimentar o empossado**.

Se me intriga se poderá ter havido algum propósito oculto na pré-promoção excessiva associada à comunicação presidencial do passado 31 de Julho, não tenho dúvidas quanto à dispensabilidade do artigo que Mário Soares ontem publicou no Diário de Noticias, onde nada acrescenta às críticas entretanto feitas a Cavaco Silva e ao que já fora dito a esse respeito. Como contrapeso, ficou-lhe aquilo que pode ser qualificado como a deselegância do gesto, pondo-se a jeito para apanhar com as inevitáveis acusações de mau perdedor (das eleições presidenciais) além das de incoerência, com Mota Amaral a relembrar como Soares anunciou o veto do Estatuto dos Açores em Setembro de 86 com o mesmo espavento televisivo que agora critica ao sucessor... A coerência nunca foi, de facto, o forte de Soares e agora, que ele está longe da área do poder, tende cada vez mais a ser julgado sem qualquer indulgência pelos seus actos…

* Acordo de Cavalheiros, cumprido por eles mas não lavrado por escrito.
** De referir que é uma guerra sem inocentes e que Cavaco se tem desforrado

Adenda de dia 9 de Agosto: Depois de Mário Soares, mas com muito menos espavento que ele, foi a vez de Ramalho Eanes se pronunciar sobre a comunicação presidencial, discutindo a forma, mas concordando com o conteúdo. Estas coisas só levam a situações caricatas, como que esperando a opinião de Jorge Sampaio para desempatar, houvesse um conselho sombra de ex-presidentes...

7 comentários:

  1. Para Soares “Ele” é um arrivista da Democracia, um presidente sem classe, inculto e pouco dado às etiquetas da burguesia, que come com a boca aberta, não sabe nunca onde pôr as mãos, veste o casaco sem tirar o “cabide” etc.
    Só que este, sendo “mal educado” , chegou para ele nas eleições (com a preciosa ajuda de Sócrates) e Soares que teve educação de berço, não perde uma oportunidade para o humilhar, mesmo que para isso tenha que lhe disputar o "chinelo", num jogo de gope e contra-golpe…

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  2. Se Soares teve educação de berço perdeu-a entretanto, depois de sair do berço... o JRD lembra-se do "Oh Shô Guarda, desapareça!..."?

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  3. Há um provérbio " a panela repreende que a frigideira é negra.
    Senhor Soares e o presidente actual cavaco Silva são duas grandes figuras históricas de Portugal. Ambos são um ao outro o pólo oposto a respeito do estilo de presentação e ideias . Contudo, uma coisa tem comum, ambos são demasiado políticos partidários. Sobre esse ponto acho que o anterior presidente Sampaio conseguia melhor ser o presidente de todos os portugueses.
    Cumprimentos de Antuérpia.

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  4. Lembro-me muito bem. Essa e outras arrogâncias são uma imagem de marca.

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  5. "A coerência é o último reduto para os que não têm imaginação" - lembro-me de ter visto este comentário feito por um político.

    Um pouco mais a sério, o Mário devia ter a consciência que certas atitudes podem ser atribuídas a uma certa senilidade - tal como a sua última candidatura presidencial. É um marco na nossa democracia mas é um homem com defeitos e qualidades.

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  6. Eu sou o J0oão Moutinho! da "Paz Universal" não aquele que esteve para ir até ao Everton.

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  7. Tenho pena que tenha abandonado o seu identificativo anterior, João Moutinho.

    Continuam ponderados como sempre, mas com ou sem Everton, os seus comentários tinham outro impacto na Caixa com a sua antiga assinatura...

    :)

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