06 agosto 2008

A ARTE DE SE SER ESPIRITUOSO NO LOCAL E À HORA ERRADA

Eu tivera um enfarte no dia anterior e, depois de internado, passara o dia na Enfermaria de SO para doentes cardíacos admitidos nas mesmas condições; pela primeira vez sentira-me deveras um daqueles pacientes de hospital de filme americano, com uma profusão de soros dependurados canalizados para as minhas veias e mais outra catrefa de sensores de máquinas onde os ecrãs mostravam números e emitiam avisos sonoros variados. Nos filmes, os doentes costumam morrer quando o apito passa a contínuo…

Apesar do susto, talvez a analogia com o cinema americano me tenha ficado no subconsciente, pois, ao acordar na madrugada seguinte, uma solarenga madrugada de Julho, dia de Verão, dei por mim com os lençóis totalmente manchados de sangue (resultado da agulha dos soros ter saltado durante o sono) e enquanto me destapava gradualmente para avaliar os estragos dei por mim a resmungar: - Agora, o que faltava mesmo era descobrir uma cabeça de cavalo aos pés da cama*…
Depois, fiquei dividido entre a satisfação de me sentir a recuperar a força anímica depois de ter tido o enfarte e a decepção de ter malbaratado aquela excelente piada perante um auditório (os restantes doentes da Enfermaria de SO) que não estava visivelmente nada interessado nos meus ditos espirituosos matinais. Ainda concebi a hipótese de um milagre, mas entre as enfermeiras que chegaram dali a pouco, nem uma me pareceu, remotamente, com pinta de cinéfila…

* Alusão a uma famosa cena do filme O Padrinho.

4 comentários:

  1. Sempre oportuno nos teus acessos de humor! Sobretudo sabes escolher bem o teu público alvo.
    Alguns, certamente, já nem estariam vivos (era uma zona de doentes graves!); outros, provavelmente estavam ainda a dormir e os que estavam acordados ou não perceberam a subtileza do teu comentário, ou estavam de tal modo assustados (estavam num hospital e gravemente doentes, bolas)que nem fizeram por entender ou, o mais provável é terem pensado que estiveste a meter para a veia...

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  2. Que eu tivesse dado por isso, morto só estaria o hipotético cavalo; em estado evidente de senilidade seriam vários.

    Aliás, dada a minha diferença de idade para o paciente médio daquela enfermaria (uns 20 a 25 anos) senti-me como o Gorbatchev em pleno "Presidium do Soviete Supremo do Comité Central do PCUS"...

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  3. lolol

    Só tu...

    Beijinhos :)

    Cristina Loureiro dos Santos

    [como se não soubesses...]

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