06 dezembro 2007

O MOVIMIENTO

Paul Preston e Antony Beevor são dois reputados historiadores britânicos contemporâneos (nasceram ambos em 1946), que se especializaram em História europeia das décadas de 30 e 40 do Século XX. Tivesse Miguel Sousa Tavares tido o cuidado de ler com a aplicação devida os dois livros A Guerra Civil de Espanha da autoria de cada um deles, em vez de os ter inserido a seco na bibliografia do seu Rio das Flores, e teria dificultado mais um bocado a tarefa a Vasco Pulido Valente na sua metódica tarefa de o desancar quanto à ignorância sobre o que se passou em Espanha nesses anos. Fique claro que creio que Pulido Valente iria encontrar outros pretextos mais rebuscados para as suas críticas; só que assim, demonstrando não ter captado o essencial do que esteve em disputa em Espanha naqueles anos, Sousa Tavares facilitou-lhe muito a vida...
Mas o livro de Paul Preston que mais aprecio é uma enorme biografia do Caudilho Francisco Franco (com quase 800 páginas de texto e 200 adicionais de notas) que, quando publicada também em Espanha na sua versão castelhana em 1994, obrigou a uma espécie de contra-ataque ideológico e editorial da direita conservadora espanhola, reeditando (e ajustando) uma versão da biografia de Franco que havia sido publicada originalmente ainda em vida deste (1973), da autoria do historiador Ricardo de La Cierva. Em qualquer das duas biografias, narrado de forma mais crítica ou mais benigna, um dos episódios que se revestiu de uma faceta particularmente caricata foi o da fusão das diversas organizações que apoiavam o lado nacionalista debaixo da autoridade do Caudilho, em plena Guerra Civil, em Abril de 1937.
Sendo organizações com historiais e propósitos distintos, não querendo os membros de cada uma delas abdicar das denominações respectivas (como bons castelhanos que eram, davam tanto – ou mais – valor à aparência que à substância…), apesar dos esforços de mediação de Franco, a nova organização acabou por ganhar o improvável nome de Falange Española Tradicionalista y de las Juntas de Ofensiva Nacional-Sindicalista, que se conseguia abreviar para um, mesmo assim pouco prático, FET y de las JONS. Provavelmente, como assinala Preston, tratou-se do mais extenso nome de partido político com responsabilidades governativas em todo o mundo e até à data. Acima vê-se a bandeira da nova organização, abaixo a do movimento carlista, também na órbita do franquismo…
Mais tarde (1949), discretamente, acabou-se com aquele disparate, optando-se pela designação Movimiento Nacional, depressa abreviado para um mais coloquial Movimiento. Pensando nos apregoados direitos de tendência preconizados por Paulo Portas para o seu Partido Popular ou nas muito comentadas na blogosfera rupturas recentes entre colaboradores de blogues que se assumem orgulhosamente de direita, fica-me a sensação de como essa designação genérica (a direita) pode albergar concepções bem distintas e mesmo contraditórias entre elas e como a perspectiva da proximidade de alcançar o poder é um bom viático para poder abafar essas distinções… Mas isso, em Portugal, é uma hipótese que não parece pôr-se para amanhã…

4 comentários:

  1. Na bibliografia de MST constam os dois livros, creio. Julgo que Beevor será mais fiável, ou mais preciso, já que Preston toma posição clara perante as partes. A Guerra de Espanha é daquelas matérias sobre as quais nunca se chegará a um acordo.
    De qualquer forma,a crítica de VPV soa a revanche, e nalguns pontos também é discutível (apesar de haver erros de monta no livro).

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  2. Na bibliografia de Sousa Tavares constam Beevor, Preston, Hugh Thomas (The Spanish Civil War), e mais Iva Delgado e César Oliveira (ambos chamados "Portugal e a Guerra Civil de Espanha").

    A existência de três livros sobre um mesmo tema (mais dois sobre um tema colateral) faz esperar um certo rigor no tratamento do assunto, nomeadamente o cuidado de construir uma opinião em profundidade, feita de várias perspectivas - que creio não haver dada a falta de fontes do lado nacionalista.

    Noutra hipótese, Sousa Tavares já tinha umas ideias sobre o assunto, precisou de consultar algum livro por precisão de datas e locais dos acontecimentos e depois "mandou" 3+2 livros para "encher" a bibliografia. Acontece com outras pessoas... Mas não com o impoluto Sousa Tavares, POIS NÃO?

    Agora, passando para um assunto sério, o consenso sobre a Guerra de Espanha só se atingirá quando se fechar o ciclo que aquela Guerra veio interromper e que recomeçou em 77: a secessão da franja oriental (Catalunha).

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  3. Erro nas bandeiras e nos partidos...

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  4. Obrigado pela observação sobre as bandeiras, Eduardo.

    De facto, a bandeira de baixo pertence aos carlistas e não à JONS e a correcção está feita.

    Quanto ao "erro nos partidos" é que tem de ser mais explícito... Qual erro?

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