21 julho 2007

JOÃO COITO

Antes da política ter entrado para a televisão como assunto normal, o que só aconteceu depois de 25 de Abril de 1974, os assuntos de política, ou eram tratados directamente do produtor para o consumidor, sem vestígios de contraditório, como acontecia com as famosas Conversas em Família do presidente do conselho, Marcello Caetano, ou então estavam a cargo de comentários dos comentadores especializados de jornalistas devidamente doutrinados como era o caso de João Coito (abaixo).
O que melhor recordo de João Coito era a sua voz, que era ao mesmo tempo tão grave quanto extremamente seca. Lembro-me também de como a maioria das pessoas não prestavam atenção ao que dizia, como se o assunto de que falava fosse para entendidos, como uma página de economia ou de cotações de bolsa, ou um qualquer programa de filatelia. E de como, para quem lhe prestava atenção, a sua tarefa era explicar assuntos que, mesmo para um leigo, tinham facetas de inexplicável.
Mesmo para um puto muito atento e extremamente receptivo como eu era então, tornava-se difícil captar a importância que João Coito pretendia conferir a uma cerimónia como foi a da reeleição do presidente Américo Thomaz por um colégio eleitoral em Julho de 1972 - o colégio era composto maioritariamente por velhos jarretas, eu vi, a televisão deu a cerimónia em directo... Se só havia um candidato, onde estava a importância, a emoção e o interesse da cerimónia? Solenidade? Estamos de acordo. Agora o resto…
A subtileza de muitos outros assuntos que João Coito tratava, escapava-me. Os actos eleitorais, contudo, com a ausência de disputas entre esquerdas e direitas, como se ouvia que acontecia no estrangeiro eram um verdadeiro desapontamento – vide as eleições legislativas de 1973 (cartaz de cima). Também não era assunto que se falasse frequentemente, tanto em casa, como entre amigos. Será este desinteresse actual pela política de que se fala um retorno à mesma fase de um ciclo que se repete? É que, desta vez, a culpa não é do fascismo…

4 comentários:

  1. O João Coito era intrinsecamente um homem honesto. Acreditava estar a fazer o melhor para o seu país. Nunca mamou na teta do Orçamento como alguns "independentes" post-25 de Abril. Fazia-o por convicção. Errada? Talvez. Mas honesta. Hoje os comentadores televisivos são ainda mais parciais e serviçais do Poder do que o João Coito porventura o foi. Defendia valores. Outros hoje defendem interesses. Paz à sua alma.

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  2. O comentário anterior quase parece um desagravo à pessoa de João Coito, quando creio que nada no "poste" o está a acusar pessoalmente de nada.

    Fossem quais fossem as suas convicções e intenções, João Coito funcionou como um ideólogo do regime. Quanto ao que o motivava e ao que motiva os comentadores da actualidade, a processos de intenções, passados e presentes, não é minha intenção fazê-los aqui...

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  3. Na verdade,é muito dificil,nos tempos que correram e correm,surgir alguem que creia que a honestidade,integridade se sobreponha ao "tacho",ao belo carro,charuto e restaurante de moda.
    Modesto,mas brilhante,incorruptível,firme nas suas crenças,assim faleceu João Coito.
    Acusem-no de símbolo do regime anterior,acusem-no de o continuar a defender depois de ter sido vergonhosamente saneado do Diário de Notícias,vetado ao quase esquecimento,mas nunca o poderão acusar de "vendido",oferecido "troca-tintas"!
    E foi assim que faleceu!
    Fiel às suas convicções,principios morais e religiosos!
    Os "amigos"abandonaram.no a troco de um trabalho,alguns, em sítios públicos fugiam dele como ratos fogem das armadilhas!Nºao se fossem comprometer!!!
    Verdadeiros ratos...dos canos!
    Extraordinário que até para esses "canalhas",João Coito arranjava sempre uma desculpa para tão vil comportamento.
    Foi assim sempre,assim partiu para um lugar que desconhecemos,mas onde certamente não os encontrará...nem que seja para lhe reapertar a mão!
    Porque,conforme acreditava,no Céu não há lugar para traidores...
    Aproveito para recordar que pós 25 de Abril,salvo algumas honrosas excepções,os chamados "homens de esquerda" nunca lhe virarm a cara...antes pelo contrário.
    O brilhante jornalista e escritor Baptista Bastos,de quem sempre fui um grande admirador, foi seu grande amigo e nunca se coibiu de o elogiar...na Televisão...na Rádio,públicamente!
    São assim os Amigos e Homens!
    A memória nunca é curta!
    Os outros,alguns já partiram para direcção oposta de João Coito,outros já estiveram presos,os restantes até já teêm saidas precárias.Mas a vida deve ser um inferno.
    Talvez. porque o que sempre sobrou em honestidade a João Coito nao poderia chegar para cobrir a corrupção,podridão desses "Judas".
    Nem uma lágrima pelo que sofreram e ainda sofrem alguns desses.
    Pelo João Coito,sempre lágrimas de saudade,pelo exemplo que deixou,enfim,pelo ser humano fantástico que sempre foi.
    Espero juntar-me a ele um dia!

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  4. Meu avô me ensinou que a Humanidade se divide em duas grandes classes: Gente e bicharada. Na área da Gente há os Homens com agá GRANDE e os homens com agá pequeno. O João era com um agá do tamanho do Universo. Só agora soube que nos deixou. E deixou com muita saudade. Muita...

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