12 maio 2007

O PAÍS A QUE CHAMAM FYROM

Por anos a fio, e até hoje em alguns casos (a União Europeia é um deles), a obstinação grega obrigou que uma das antigas unidades da federação jugoslava fosse designada pelo acrónimo bizarro de FYROM, que corresponde, em inglês, a Former Yugoslav Republic Of Macedonia (Antiga República Jugoslava Da Macedónia). A objecção grega está associada ao que os gregos consideram a sua posse histórica do nome de Macedónia, desde a Antiguidade e do reino de Filipe e Alexandre. Aliás, imediatamente ao Sul da república que se separou da federação jugoslava, existem três distritos gregos usando esse nome: a Macedónia Central, a Macedónia Ocidental e a Macedónia Oriental e Trácia.

O ministro dos negócios estrangeiros grego, quando enviado a Portugal no princípio do diferendo (1992) para nos conquistar para a sua causa, arranjou uma analogia bastante imbecil, envolvendo-nos com uma Espanha a decompor-se, numa demonstração que o trabalho dos membros da sua Embaixada em Lisboa tinha uma grande margem de progressão… A analogia envolvia a independência da província espanhola da Extremadura e do incómodo que isso nos causaria por causa da semelhança do nome desse país hipotético com a nossa província da Estremadura, que nem sequer lhe fica contígua… E, contudo, com o mesmo uso do hipotético teria sido bem simples e eficaz sensibilizar-nos: se a Andaluzia se separasse de Espanha e adoptasse o nome histórico de Algarve, como nos sentiríamos?...
Politicamente, Macedónia é uma designação cheia de potencial para se transformar numa tremenda trapalhada. Pode ser uma região histórica, sem significado actual, ou pode ser uma região geográfica, passível de ser organizada politicamente das maneiras mais diversas, pode também ser apenas um subgrupo cultural de entre os eslavos dos Balcãs, mas poderá ser uma verdadeira nação separada, será praticamente tudo o que dela quisermos fazer. Ao mesmo tempo, podem-se percorrer os países vizinhos (Sérvia, Bulgária e Grécia) e encontrar ali alguma unanimidade de opiniões em como não existem razões suficientemente válidas para que exista uma identidade macedónia própria que justifique a existência de um país independente.

A argumentação que sustenta a existência de um idioma macedónio autónomo é peça importante para a afirmação da existência de uma nacionalidade macedónia. Todos os idiomas eslavos dos Balcãs se assemelham e as várias formas faladas que se empregam na Macedónia tanto se distinguem entre si como das variantes empregues nas regiões adjacentes dos vizinhos da Sérvia e da Bulgária. Mas as referências usadas no macedónio literário aproximam-no daquelas que caracterizam o búlgaro, embora privilegiem os padrões do búlgaro empregue nas regiões ocidentais da Bulgária, enquanto o próprio búlgaro literário o faz com os padrões da Bulgária oriental, onde se situa Sófia, a capital.

A maioria dos macedónios são cristãos ortodoxos, organizados numa Igreja Ortodoxa Macedónia autónoma que foi recriada (ou criada, conforme as versões…) em 1958. Pôde-se notar o apoio discreto do governo federal jugoslavo na sua fundação e a Igreja Macedónia ainda hoje é proscrita na comunidade das Igrejas Ortodoxas. Existe uma minoria muçulmana, embora haja uma enorme certa complexidade em classificá-la: há os que são de cultura albanesa, outros são classificados como bósnios ou mesmo turcos e há ainda a categoria dos muçulmanos de cultura macedónia. Num exemplo flagrante como os resultados dos censos podem ser trabalhados, o último grupo cresceu de 1.600 pessoas no recenseamento de 1953 para 39.500 no de 1981…
Pelo que ficou escrito nos dois últimos parágrafos deste poste, é fácil perceber a importância da acção do governo jugoslavo do pós-guerra, chefiado por Tito, um croata, na promoção da constituição de uma nacionalidade macedónia distinta que enfraquecesse a Sérvia (a comunidade mais numerosa da Jugoslávia) e assim facilitasse o estabelecimento dos indispensáveis equilíbrios internos entre sérvios e croatas dentro da federação jugoslava. Foi uma manobra superiormente bem feita, porque, para além dessa componente de equilíbrio interno, a criação de uma nação macedónia neutralizou as aspirações da Bulgária que os queria considerar búlgaros além de que a escolha do nome se tornou uma potencial ameaça para a Grécia numa eventual disputa de um acesso para o mar…

Mas toda a beleza maquiavélica da criação da Macedónia assentava no pressuposto que ela continuaria a ser uma das unidades constitutivas de uma federação… Agora que se tornou independente, isolada do mar e rodeada de vizinhos hostis (Albânia, Sérvia, Bulgária e Grécia), a Macedónia é um verdadeiro problema político em potencial para a União Europeia, mais um par de botas balcânico, tipificado naquela proibição formal do país usar o seu próprio nome e na manutenção, ainda hoje, de um Quartel-General da NATO em Skopje, capital da Macedónia, não venha a acontecer qualquer coisa de inesperado…

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