13 janeiro 2007

O PAI TIRANO E OS DOIS COPINHOS DE VINHO BRANCO

Para quem não conheça este grande filme português de 1941, recomendo-lho. Contudo, dadas as vezes que o mesmo já foi repetido nos ecrãs de televisão suspeito que o número de portugueses que ainda o não conheçam deva ser aproximadamente igual ao de eleitores que tenham razões para ainda estar indecisos sobre a decisão a tomar no próximo referendo de Fevereiro.

É que, estando a repetir-se um referendo que já foi feito há oito anos, apenas para as gerações mais novas (que não votavam naquela altura) é que a maioria da argumentação agora produzida pode constituir novidade. Saúde-se, contudo, que, até agora, os disparates argumentativos associados aos dois lados parecem estar felizmente mais contidos do que da última vez. Regressando a O Pai Tirano (ou O Último dos Almeidas), de seu título completo, quase todos os que o viram se recordam de uma cena, quase no final do filme, onde um dos membros da companhia de teatro, o Sôr Machado (acessoriamente, é uma das melhores caricaturas do filme, a do português sorna-tá-bem-não-te-rales) leva a sua (recente) namorada a jantar no buffet do teatro.

Embora os que se recordam da cena, se tenham fixado sobretudo no gag da repetição dos pedidos dos dois copinhos de vinho branco, talvez não tenham prestado ao requinte associado aqueles pedidos. Em primeiro lugar, Machado tem a delicadeza de perguntar a Teresa o que lhe apetece, ao que esta responde rissóis de camarão que, não havendo, foram substituídos pelos primeiros copinhos de vinho branco.
Depois do peixe (neste caso marisco) passa-se para a carne, e a sugestão de Teresa vai para uns croquetes de vitela. Note-se o requinte dos croquetes serem de carne de vitela, a que o pedido de Machado vem dar ainda uma outra nota adicional, adicionando não só a sua concordância – Vamos nisso! – como também precisando no pedido que eles fossem bem fresquinhos. E lá foram substituídos pelos segundos copinhos de vinho branco…

Ficou a faltar a sobremesa e para ela a sugestão de Teresa foi para uns pastelinhos de Belém que Machado, mais uma vez, precisou que viessem muito quentinhos, ao que o empregado anuiu automaticamente, depositando sem mais palavras um terceiro par de copinhos de vinho branco que o casal de namorados agarrou sem mais delongas e sem qualquer sinal de surpresa.

Não será o gag mais cómico de sempre mas vê-se ter sido pensado a fundo quando foi construído (há quem não preste qualquer atenção aos pedidos na sequência do peixe-carne-sobremesa, mas haverá quem o faça). Por curiosidade, dá mostras de um rigor profissional que é precisamente o oposto do que o personagem do Sôr Machado representa no filme e será talvez uma das razões para o sucesso que aquele filme ainda mantém hoje em dia.

1 comentário:

  1. E quantos copinhos de vinho branco terá bebido o Luisão?halelm

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