27 novembro 2005

A PRIMEIRA VEZ QUE CÁ VIM, DEPOIS DA ÚLTIMA VEZ QUE CÁ ESTIVE

Existe um argumento poderoso entre aqueles que defendem a extinção da monarquia, quando aludem aos eventuais problemas de debilidade mental ou de senilidade de um monarca, para preconizarem a sua abolição.

Só que, na verdade, as monarquias nem têm o exclusivo desse problema, basta até lembrarmo-nos, entre nós e para aqueles que são mais velhinhos, da veneranda figura do Chefe de Estado até 1974, Almirante Américo Tomás – ou Thomaz, como era chique naquela altura.

Apesar de todos dizerem ter sido um sujeito simpático (com quem até tenho um jogo de fotografias a receber um prémio), acabou por ficar para a história como um dos símbolos maiores da decrepitude de um regime, que se mostrou incapaz de se renovar.

Há algo que nos faz recordar Américo Tomás na maneira de estar do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Nunes da Cruz. Já numa intervenção televisiva anterior, no programa Prós e Contras, o Juiz Conselheiro, figura máxima de todo o poder judicial português, tinha dado de si uma imagem não muito feliz. Recentemente, no VII Congresso dos Juízes, a prestação não foi melhor.

Só que o problema excede os problemas de imagem ou de telegenia. Esses foram os problemas de figuras públicas como Ramalho Eanes ou Cavaco Silva, que se empenhou em corrigi-los até se ter aborrecido e desatado a comer o bolo-rei à frente das câmaras. Em qualquer dos casos, e outros (Mota Pinto, por exemplo), nunca esteve em causa o que estava por detrás da falta de à-vontade diante de câmaras e microfones.

No Congresso dos Juízes, parecia que estávamos a ver uma figura vinda directamente do passado ou que, alternativamente, tinha estado a viver em algum lugar reservado, um mosteiro talvez… Parecia um Patriarca duma Igreja Ortodoxa do Leste, ou um daqueles monarcas europeus dos filmes do princípio do século XX – com a vantagem desses filmes serem mudos.

Com a assessoria a ser protagonizada pelo dirigente da Associação Sindical dos Juízes (*), Baptista Coelho, que emprega, com requinte vocabular, uma argumentação lógica que não desdenharia a um dirigente do sector metalúrgico da década de 1940, no período das justas lutas dos trabalhadores (**), parece-me evidente que o Ministro da Justiça pouco precisa de argumentar.

Se o poder judicial se sente bem, assim representado, então serão os próprios intervenientes que se enforcam, perante a opinião pública, e com uma corda que eles próprios teceram.

(*) Um Sindicato de Juízes tem tanto sentido como, por simetria, a Ordem dos Tratadores de Lixo.
(**) PCP dixit.

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